quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Para Hafiz de Shiraz



Assim disse o Poeta: “Quando a Morte aproximar-se de você,
De todos vós - cujas vidas são areia que se esvai pela ampulheta -
Repousará dois dedos em suas orelhas, outros dois
Sobre seus olhos deitará; um sobre seus lábios,
Sussurrando: ‘Silêncio!’ Embora surda tua orelha,
Teus olhos, meu Hafiz, sofrerão o eclipse do Tempo.
As canções que tu cantastes, todos os homens ouvirão.

Cantos de risos mortais, canções de amor outrora quente,
Músicas de cálices uma vez enrubescidos pelo purpúreo vinho,
Cantos da rosa cuja beleza foi esquecida,
Um rouxinol cujo assobio silencioso é lançado ao divino;
Ainda assim uma música pétrea corre sob
As afetivas notas do amor das canções que são tuas,
Oh!, Buscador das chaves da Vida e Morte!

Enquanto foste cantante, tanto o suave vento do verão
Que sobre o jardim de Mosalla soprava quanto o riacho
De Ruknabad, fluindo junto às rosas retorcidas,
Carregaram tua voz mais distante do que conseguinte sonhar.
A Isfahan e à horda tártara de Baghdad,
Do refugo ao mar, ao Yezd e ao distante Hind;
Sim!, ao ocaso levaram tuas palavras.

Eis que nós rimos, nos esquentamos junto ao fogo do Amor,
Sedentos do, ousamos dizer, escasso vinho que ansiamos,
Levantamos vozes junto ao coro de escuro manto do Pesar.
Cante a alegria da sabedoria e a tristeza que tiveste!
Se minhas pobres rimas algo possuírem do conhecimento do coração,
Grinaldas novas serão tuas para deitar sobre tua sepultura -
Mestre e Poeta, tudo já era teu antes!”

(extraído de HAFIZ. The Garden of Heaven. Translated by Gertrude Bell. New York: Dover Publications, 2003 [1897])

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Presente contra a angústia



Mollâ Sadrâ está entre aqueles que muito bem sabiam que nunca conhecemos senão em proporção ao nosso amor, sendo nosso conhecimento a forma própria do nosso amor. Além disso, tudo aquilo que os indiferentes chamam como "passado" continua "à frente" em proporção ao nosso amor, isto é, o amor é ele próprio a fonte do futuro, uma vez que lhe dá vida. Basta que tenhamos a coragem de amar.

(traduzido de Henry Corbin, En Islam iranien: aspects spirituels et philosophiques 1. Le shi'isme duodécimain, p.37-8, por Muhammad F.)

terça-feira, 3 de junho de 2014

Alguns beijos que desejamos (Rumi)


Existem beijos que desejamos por
toda nossa vida, como o toque do

espírito no corpo. A água do mar
implora à pérola que quebre sua concha.

E o lírio que, apaixonadamente,
precisa de um amante selvagem! Na

noite, abro a janela e peço
à lua para aproximar-se e espremer

sua face contra a minha. Respire dentro
de mim. Feche a porta da língua e

abra a janela do amor. A lua
não usa portas, apenas janelas.

(extraído de http://peacefulrivers.homestead.com/Rumilove.html - tradução de Muhammad F.)

O que é simbolismo? - por Martin Lings (pt. 3)




Se os símbolos do macrocosmo, tomados coletiva ou separadamente, são lembretes para o peregrino espiritual da perfeição perdida pelo Homem, os símbolos mais imediatos serão microcósmicos, isto é, o Verdadeiro Homem ele mesmo, personificado por seus Profetas, Santos e pelo Mestre Espiritual vivo. Embora não haja dúvidas sobre a riqueza da verdade disso, seria uma mera simplificação reduzir os símbolos macrocósmicos a um segundo lugar - em qualquer sentido absoluto - quanto ao seu significado espiritual para o homem, uma vez que muito dependerá do indivíduo que os apreende e de suas circunstâncias. Para além destas alteridades e semelhanças, os símbolos possuem seu próprio impacto especial. O Alcorão afirma a eficácia de ambos: "De pronto lhes mostraremos os Nossos sinais em todas as regiões (da terra), assim como em suas próprias pessoas." (41: 53)

Consideremos, tomando um exemplo particular, a virtude da dignidade, a qual deve ser descrita como a majestade em repouso, e que o homem, se for verdadeiro com sua natureza, procurará aperfeiçoá-la juntamente com outras virtudes que refletem as demais Qualidades Divinas. O cisne incorpora apenas um aspecto da dignidade, mas o faz com perfeição; isolando-se esta perfeição, ela é para o homem uma clara e poderosa impressão, irresistível por ser apresentada em modo não humano, isto é, um modo que está além de nosso alcance. Essa superação fornece-lhe asas que, aos olhos do observador, permitem à dignidade retornar ao seu Arquétipo. O mesmo poderia ser dito de todos os outros grandes símbolos terrestres que não são humanos, como o céu, planícies, oceanos, desertos, montanhas, floretas e rios que englobam - cada uma destas "palavras" sendo eloquentes nas línguas que os membros das raças branca, amarela e preta partilham.

Uma vez que nada possa existir exceto em virtude de seu enraizamento Divino, isto significa que tudo pode ser um símbolo? A resposta é sim e não - sim pela razão dada e não porque "símbolo" significa "sinal" ou "emblema", o que implica em poder operativo de recordar algo, seu Arquétipo. À luz do versículo citado de que nada exite que não seja para O glorificar em louvor, podemos dizer que o que quer que possa ser chamado de símbolo dependerá o quanto este "louvor" é poderoso ou débil. A palavra símbolo é normalmente utilizada para aquilo que é particularmente impressionante na "glorificação".

(extraído de http://www.reneguenon.net/oinstitutotextosLingsSymbol.html - tradução Muhammad F.)


[trechos do Alcorão extraídos de Os significados dos versículos do Alcorão Sagrado, tradução de Samir El Hayek.]

Carta para a Compaixão (Karen Armstrong)


O princípio da compaixão repousa no coração de todas as tradições religiosas, éticas e espirituais, conclamando-nos a sempre tratar os outros do mesmo modo que gostaríamos de sermos tratados. A compaixão nos impele a trabalhar incansavelmente para aliviar o sofrimento de nossos companheiros, a destronarmos a nós mesmos do centro de nosso mundo e colocar o outro neste lugar e a honrarmos a inviolável santidade de todo ser humano, tratando a todos, sem exceção, com absoluta justiça, equidade e respeito.

Também se faz necessário, tanto na vida privada quanto na vida pública, evitar consistente e empaticamente infligir a dor. Agir ou falar violentamente por despeito, chauvinismo ou egoísmo para empobrecer, explorar ou negar direitos básicos para qualquer um, ou incitar o ódio denegrindo os outros - mesmo nossos inimigos -, são modos de negar nossa humanidade em comum. Nós reconhecemos que falhamos em viver de modo compassivo e que inclusive algumas pessoas aumentaram a miséria humana em nome da religião.

Nós, portanto, clamamos a todos os homens e mulheres para restaurarem a compaixão como centro da moralidade e da religião - retornando ao princípio de que qualquer interpretação da escritura que leve à violência, ódio ou desprezo, é ilegítima - garantindo que aos jovens sejam dadas informações precisas e respeitosas sobre outras tradições, religiões e culturas - encorajando uma apreciação positiva da diversidade cultural e religiosa - cultivando uma empatia esclarecida com o sofrimento de todos os seres humanos (mesmo que sejam considerados inimigos).

Precisamos urgentemente fazer da compaixão uma clara, luminosa e dinâmica força em nosso mundo polarizado. Enraizada em uma determinação de princípios que transcende o egoísmo, a compaixão pode demolir as fronteiras políticas, dogmáticas, ideológicas e religiosas. Nascida de nossa profunda interdependência, a compaixão é essencial para as relações humanas e para uma humanidade plena. É o caminho para a iluminação, indispensável para a criação de uma economia justa e uma comunidade global pacífica.

(extraído de http://charterforcompassion.org/the-charter - tradução de Muhammad F.)

quinta-feira, 29 de maio de 2014

(Rumi)

Venha, venha, quem quer que você seja.
Peregrino, idólatra ou fugitivo,
Não importa.
Esta não é a caravana do desespero.
Venha, mesmo que tenha quebrado seus votos
mil vezes.
Venha mais uma vez: venha, venha.

(extraído de http://www.khamush.com/poems.html - tradução de Muhammad F.)

quarta-feira, 28 de maio de 2014

(Rumi)

Morri de mineralidade e tornei-me vegetal;
Da vegetabilidade morri e tornei-me animal.
Morri da animalidade e tornei-me homem.
Assim, por que temer o desaparecer pela morte?
De novo devo morrer
Mas trazendo asas e penas, como um anjo;
Assim, ascenderei mais alto que os anjos.
Aquilo que você não concebe:
Eu serei isto.

(extraído de http://www.khamush.com/poems.html - tradução de Muhammad F.)

terça-feira, 27 de maio de 2014

Poema 14 (Ibn 'Arabi)


Ele viu o relâmpago no Leste, ansiando pelo Leste:
se tivesse brilhado no Oeste, ele teria ansiado pelo Oeste.
O desejo é pelo trovão e seu brilho, não pelos lugares que cai.

O vento Leste me trouxe uma tradição herdada,
de pensamentos distantes,
da minha paixão,
da angústia
de minha aflição,
Do arroubo
da minha razão,
do desejo ardente
da paixão,
das lágrimas,
da minha pálpebra,
do fogo
do meu coração,
De que "Ele que você ama está entre suas costelas; seu respirar O acalenta por cada lado."

Disse para o vento Leste "Leve a minha mensagem a Ele e diga que Ele incendeia em meu coração.
Se deve ser saciado - então eterna união . Se deve queimar - não há culpa para o amante, então!"

(extraído de http://www.ibnarabisociety.org/poetry/ibn-arabi-poetry-index.html - tradução de Muhammad F.)

segunda-feira, 26 de maio de 2014

(Jami)


Tudo no mundo criado é ilusão, fantasia: reflexo em espelhos, sombras.
Mas o Sol da Orientação amanheceu na sombra do "Outro que não Deus": não erre pelo deserto do erro!
Que é o Homem? O reflexo da Luz Eterna.
Que é o mundo? Uma onda no Eterno Mar.
Como o reflexo poderia separar-se da Luz?
Como a onda poderia separar-se do Mar?
Saiba que reflexo e onda são Luz e Mar: aqui a dualidade é duplamente impossível.
Veja os viajantes no Caminho do Amor, veja cada um em seus diferentes estados espirituais:
Um deles vê em cada átomo do mundo um Sol radiante e inextinguível.
Outro testemunha no espelho da existência a beleza dos arquétipos ocultos.
Um terceiro vê o Um no outro, sem véu ou imperfeição.

(extraído de http://www.ibnarabisociety.org/articles/jamiwine.html - tradução de Muhammad F.)

O que é simbolismo? - por Martin Lings (pt. 2)


O próprio Espírito encontra-se aberto à Suprema Fonte de toda luz, tornando-se, para aquele cujo Coração está desperto, uma continuidade entre as Qualidades Divinas e a alma, um raio que passa por Elas do Espírito ao Coração, a partir do qual difunde-se em múltiplas refrações ao longo dos diversos canais da substância psíquica. As virtudes que são deste modo gravadas na alma não são outra coisa senão projeções das Qualidades e, inversamente, cada uma das imagens projetadas estão abençoadas com a intuição de seu Arquétipo Divino. Assim como para a mente, com sua razão, imaginação e memória, uma medida da "luz lunar" que é recebida pelo Coração é passada aos sentidos e os atingem tanto quanto os objetos externos que podem ver e ouvir e sentir; neste contato mais distante, o raio é então invertido, pois as coisas do macrocosmo são reconhecidas como símbolos, isto é, como manifestações semelhantes ao Tesouro Escondido, cada uma delas possuindo sua contraparte no microcosmo. Expresso de outro modo, tudo para o homem primordial, interna ou externamente, era transparente: ao encontrar um símbolo, ele experimentava seu Arquétipo. Ele era, portanto, capaz de se alegrar ao perceber-se exteriormente cercado e interiormente adornado pelas Presenças Divinas.

A ingestão do fruto da árvore proibida foi a conexão com um símbolo tão somente para o bem do próprio Homem, para além de seu significado mais elevado. A violação da norma interrompeu o acesso do Homem ao seu centro interior: a consequente indefinição de sua visão o fez incapaz de cumprir adequadamente sua função original, a de mediador entre o Céu e a Terra. Apesar de sua queda para o microcosmo, o macrocosmo permaneceu elevado; ainda que seus símbolos tenham se tornado menos aparentes para a percepção humana, eles permaneceram em sua perfeição original. Apenas o homem primordial faria justiça a esta perfeição: ao mesmo tempo, ele permaneceria independente dos símbolos, em virtude de ser ele mesmo um símbolo da Essência Divina, que é absolutamente Independente das Qualidades Divinas. O homem decaído, por outro lado, teve uma lição a aprender do grande mundo que o circulava, pois seus símbolos ofereciam uma iluminação que guiariam-no para o caminho de retorno que havia perdido enquanto sua perfeição poderia evidenciar a perfeição de suas contrapartes internas que sofreram com a Queda. As nuvens do macrocosmo não são permanentes; elas surgem apenas para partir, pois as luzenças ainda brilham e as direções do espaço nada perderam de sua imensurabilidade. Entretanto, no homem decaído a alma não é mais uma ampla imagem do Infinito, como foi criada para ser, e o firmamento interno está velado. Este velamento é um resultado crítico da Queda, a qual não interrompeu a conexão entre a alma e o Espírito, entre a percepção humana e os Arquétipos, mas estabeleceu uma barreira que é mais ou menos opaca - cada vez mais opaca com o distanciamento humano do fato original, o que acelera a degeneração gradual que inevitavelmente ocorre com o passar de cada ciclo temporal. No contexto de nosso tema, a barreira pode ser descrita como mais ou menos transparente, uma vez que não teria sentido falar em simbolismo onde não poderia haver ao menos alguma intuição, mesmo que enfraquecida, dos Arquétipos. Ademais, a ciência dos símbolos é inextrincavelmente vinculada com o caminho de retorno, o qual, seguindo no caminho contrário à esta corrente cíclica, realiza um aumento daquela transparência.

(extraído de http://www.reneguenon.net/oinstitutotextosLingsSymbol.html - tradução Muhammad F.)

terça-feira, 20 de maio de 2014

O que é simbolismo? - por Martin Lings (pt. 1)


Os sete céus, a terra, e tudo quanto neles existe glorificam-No. Nada existe que não glorifique os Seus louvores! Porém, não compreendeis as suas glorificações. Sabei que Ele é Tolerante, Indulgentíssimo. (Alcorão 17:44)

O verso anterior é uma resposta à questão que intitulamos este capítulo. Ele também justifica em certa medida, na sua última sentença, o texto deste capítulo, pois o modo como 'algo' glorifica a Deus - e que não entendemos necessariamente - é precisamente seu simbolismo. Isto pode ser deduzido de uma "narrativa sagrada" islâmica, assim denominada porque é a Divindade falando pela língua do Profeta: "Eu era um Tesouro Escondido e amei ser conhecido, então Eu criei o mundo." Assim, o universo e seu conteúdo foram criados de modo a levar ao conhecimento do Criador, sendo que difundir o bom conhecimento é um modo de louvá-Lo. Os modos de fazê-Lo conhecido reflete-O ou mostra Sua sombra, e o símbolo é o reflexo ou a sombra de uma realidade superior.

A doutrina do simbolismos pode também ser indicada de outros versos do Alcorão, nos quais se afirma que cada coisa presente sob a Terra foi enviada em uma medida finita das Provisões ou Tesouros do Infinito, enviada como um empréstimo e não como um presente, pois nada aqui embaixo pode durar, sendo que tudo ao seu final é revertido para a Fonte Suprema. Em outras palavras, o Arquétipo é sempre o Herdeiro que herda de volta o símbolo pelo qual Ele se manifestou. E não existe coisa alguma cujos tesouros não estejam em Nosso poder, e não vo-la enviamos, senão proporcionalmente. (Alcorão 15:21) e Somos Aquele que dá a vida e a morte, e somos o Único Herdeiro de tudo. (Alcorão 15:23). Poderíamos também citar a seguinte definição corânica de Divindade: Ele é o Primeiro e o Último; o Visível e o Invisível, e é Onisciente. (Alcorão 57:3) O primeiro, segundo e quarto destes nomes relacionam-se ao Tesouro Escondido. Assim como o Exteriormente Manifesto, o mistério da Divina Presença no mundo dos símbolos é parcialmente explicado nas palavras [Deus] não criou os céus, a terra e o que existe entre ambos, senão com prudência e por um término prefixado. (Alcorão 30:8) Assim, pode-se dizer que toda a estrutura do universo é tecida de eternidade e de efemeridade, da infinitude e da finitude, do absoluto e do relativo.

O próprio Homem, do modo que foi criado - o Homem Verdadeiro, como o Taoísmo o nomeia - é o maior de todos os símbolos terrestres. A doutrina universal de que ele foi criado à imagem de Deus (Gênesis 1:27) significa esta preeminência: o Homem é o símbolo ou a soma de todos os atributos, isto é, da Natureza Divina em sua Totalidade, a Essência, enquanto as criaturas animadas ou inanimadas que o cercam refletem apenas um aspecto, ou certos aspectos, desta Natureza. Tomados em seu conjunto, estes símbolos constituem o grande mundo exterior, o macrocosmo, do qual o Homem, representante de Deus na Terra, é o centro; e este centro é ele mesmo um pequeno mundo, um microcosmo, análogo em todo aspecto ao macrocosmo, que é, como ele, uma imagem total do Arquétipo.

É através de seu centro que um mundo abre-se para tudo aquilo que o transcende. Para o macrocosmo, o homem é esta abertura; assim como para o microcosmo, seu centro é o Coração humano - não o órgão corpóreo com este nome, mas sua faculdade central da alma a qual, em virtude de sua centralidade, deve ser considerada aquém e além do domínio psíquico. A abertura do Olho do Coração ou o despertar do coração (como muitas tradições se referem) é o que distingue o homem primordial - e, por extensão, o 'Santo' - do homem decaído. O significado desta abertura interna deve ser entendido a partir da relação entre o sol e a lua que simbolizam, respectivamente, o Espírito e o Coração: assim como a lua procura pelo sol e transmite algo de seu brilho refletido para a escuridão da noite, do mesmo modo o Coração transmite a luz do Espírito para a noite da alma.

(extraído de http://www.reneguenon.net/oinstitutotextosLingsSymbol.html - tradução de Muhammad F.)

[trechos do Alcorão extraídos de Os significados dos versículos do Alcorão Sagrado, tradução de Samir El Hayek.]

sexta-feira, 2 de maio de 2014

Integrando o sagrado ao secular

Pesquisas em tradução da literatura Sufi tornaram-se um modo de reintegrar ‘o sagrado com o secular’ no mundo desencantado de hoje. A forma pela qual a literatura Sufi cria e expande os sentidos e a realidade é contemporaneamente ignorada, dada a ênfase pós-estruturalista na cultura, na ideologia e na indeterminação do sentido na língua. Porém, a significação linguística, enquanto atividade “fazedora de sentido”, de conhecimento e entendimento do Transcendental, é uma forma de criar conexões entre diferentes religiões e culturas, validando tais estudos comparativos. Verdade seja dita: seja pesquisador ou acadêmico, tradutores, críticos, historiadores, jornalistas e professores de literatura podem destruir ou criar um escritor em seus próprios termos. A pesquisa adquire o poder do ‘pharmakon’ de Platão, tanto um ‘veneno’ quando um ‘remédio’. O poder investido aos estudiosos em alterar textos e assim mudar o mundo deveria ser mais reconhecido.

quarta-feira, 12 de março de 2014


A Vida perguntou à Morte:

- Morte: por que as pessoas me amam, mas te odeiam?

A Morte respondeu:

- Porque você é uma bela mentira e eu sou uma verdade dolorosa.

[extraído de http://9gag.com/gag/a09M6rO - tradução de Muhammad F.]

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Saudades de Saddam


O maior crime dos Estados Unidos no Iraque foi levar a população a sentir saudades do passado, a olhar para o passado em busca de soluções, não para o futuro. Quando uma população sente saudades de uma ditadura, quando um ditador é colocado como um anjo, percebemos o quanto a democracia estadunidense vem prejudicando a autodenominação dos países do Oriente Médio. No caso do Iraque, não foi nem um pouco diferente.

Dos detectores de bombas que não funcionam à opressão que a comunidade gay continua sofrendo, podemos dizer que pior que o Saddam foi a intervenção estadunidense. Vergonha de ser humano.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Islamismo e xamanismo


Em El secreto de Muhammad: la experiencia chamánica del Profeta del Islam, de Abdelmumin Aya, é um dos livros mais interessantes que li recentemente. O autor está fundamentado, em praticamente toda sua análise, nos estudos do grandes historiador da religião Mircea Eliade. Quem já leu O xamanismo e as técnicas arcaicas do êxtase, em boa tradução pela Martins Fontes, e conhece um pouco da vida do Profeta Muhammad (sas), já teria alguma ideia do que o autor trataria. Entretanto, as relações estabelecidas me surpreenderam.

Como pressuposto do autor, não é possível compreender o Islã sem compreender a vida de Muhammad (sas). A experiência pela qual o Mensageiro de Deus passou estabelece os princípios para uma comunidade que passou a existir após essa experiência. À diferença dos xamãs, o Profeta propagou sua experiência; não resolveu curar ou orientar somente sua comunidade, mas também toda a humanidade.

Passando por episódio sobre a abertura do peito, a Viagem Noturna, a transmissão de sua baraka (benção), considerando as hipóteses de loucura e as leituras Ocidentais, Abelmumin Aya nos traz mais elementos para perceber o quanto o Islã é uma religião universal, aberta para todas as formas e que contempla todas as espiritualidades tradicionais.

Como o autor relata, Buda no ensinou a não sofrer. Jesus (as) nos ensinou a amar os outros. Enquanto isso, Muhammad (sas) nos ensinou o auto-controle. Não estamos dizendo que um é superior ao outro, mas que a experiência do Profeta (sas), em relação aos demais mensageiros de Deus, é extremamente particular.

Dentre o quadro sintético apresentado pelo autor, temos os seguintes elementos presentes na experiência xamânica de Muhammad (sas) (segue abaixo uma tradução desses quadro - localizado na página 147):

Elemento 1: O mensageiro alado.
Elemento 2: Violência dos mensageiros celestes.
Elemento 3: A abertura do peito.
Elemento 4: O mesmo xamã, testemunha da operação.
Elemento 5: A extração das vísceras.
Elemento 6: O coração como víscera tocada.
Elemento 7: O fechamento da ferida.
Elemento 8: As visões da luz interior.
Elemento 9: As dores de cabeça.
Elemento 10: A cova como lugar de encontro.
Elemento 11: O sonho como momento propício.
Elemento 12: O calor místico durante o transe.
Elemento 13: A destruição do mundo.
Elemento 14: Os mortos saem da tumba.
Elemento 15: A passagem pela ponte do horror.
Elemento 16: O centro do mundo.
Elemento 17: A ascensão na montanha.
Elemento 18: A cavalgadura alada.
Elemento 19: Um guia pelo desconhecido.
Elemento 20: A água da vida.
Elemento 21: Uma descrição das regiões beatíficas.
Elemento 22: A Árvore do Centro.
Elemento 23: A alma como pássaro.
Elemento 24: As esposas celestes.
Elemento 25: O descenso aos infernos.

Antes de apresentar tais elementos, o autor os aborda detalhadamente. Cada um desses elementos estão presentes nas tradições do Preofeta (sas), bem como nas ações dos xamãs ao redor do globo. Não deve ser negado o caráter de xamã a Muhammad (sas): isso em nada invalida seu caráter de Profeta. Entretanto, nem todo xamã é um Profeta...

Para ver mais livros dessa editora, clique aqui.

AYA, Abdelmumin. El secreto de Muhammad: la experiencia chamánica del Profeta del Islam. Kairós: Barcelona, 2006

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Falar contra o mal


Permanecer em silêncio
Em face do mal
É o mal em si.
Não falar
Falar é.
Não agir
Agir é.
Dietrich Bonhoeffer

sábado, 15 de fevereiro de 2014

Converta-se à sua religião



... algumas vezes penso: qual a ignorância que motiva um religioso a assumir que seu caminho é o único possível? A não perceber que às pluralidades de almas correspondem pluralidades de modo de vida, de existência e de caminhos, portanto?

Minha ideia é essa: gostaria de te converter à sua religião. Gostaria de ser alguém que te auxilia a chegar nela, a sentir em seu coração e raciocinar com seu intelectual qual o caminho que te contempla. É o ateísmo? É o cristianismo? É o hinduísmo? É o Islã? Sabe, penso que o Islã é a única religião que existe, que todas as outras não são senão ramificações e derivações; me refiro às religiões tradicionais, não aos exoterismos de pacotilha tão difundidos pela indústria cultural / capitalismo editorial. Por que das religiões tradicionais? Se o mestre e seu discípulo querem te ensinar, use o discípulo como meio para se chegar ao mestre. Não tome o discípulo como o verdadeiro mestre; ele pode ser um mestre, mas não o último.

Assim, desejo que encontre sua religião. Não a minha, mas a sua. A que está em seu coração. Que volte a ela e encontre um caminho para andar por entre as chamas. Que nada te separe da sua essência, como não era separado antes de nascer e para a qual retornará após essa vida, mas a que é possível entrar em contato e sorver suas bençãos ainda nessa vida.

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Vice sobre o Hajj


Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

O Hajj é a maior peregrinação que existe no mundo, o primeiro congresso para o qual a humanidade foi convidada e um dos pilares da religião Islâmica.

Seria ingenuidade acreditar que o Hajj continua o mesmo desde o Profeta Muhammad (sas). Muitas coisas foram modificadas... hoje as pessoas não peregrinam mais somente com seus pés e animais de carga, mas com carros, aviões, luxo e mordomias. Chegam a não dormir ao relento, como haveriam de fazer, para que possam usufruir de hotéis que margeiam a Ka'aba. Não estou menosprezando a ação de nossos irmãos muçulmanos, mas hoje me pergunto qual o verdadeiro significado do Hajj para a grande massa dos muçulmanos.

O significado do Hajj perpassa, entre outras dimensões semânticas, pelo retorno ao si mesmo, pelo encontro com Deus dentro do próprio coração. O documentário produzido pela Vice (excelente canal, com sua página no youtube disponível aqui), World's Largest Pilgrimage - Hajj (ou A maior peregrinação do mundo - Hajj), nos mostra como que, no século XXI, muitos conduzem essa procura. Que Allah nos guie, enfim. Dizer isso pode parecer desesperança... um pouco dos humanos, somente dos humanos. Nenhuma desesperança em Allah e sua orientação.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Surat al-Fajr recitada por uma irmã


Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

Continuando a assumir minha heterodoxia em relação ao sunismo, gostaria de apresentar-lhes uma belíssima recitação de uma irmã. Trata-se da Surat al-Fajr, recitada na voz de uma mulher.

... assumo que nunca, frequentando uma mesquita, ouvi uma mulher recitando - seja sunita ou xiita. Assumo que isso se deve, provavelmente, à minha falta de frequência às mesquitas: se nelas vivesse, se nelas morasse, se delas tivesse feito meu refúgio, provavelmente tal lacuna estaria sanada. Mas não, mesmo frequentando dias e dias seguidos, no Ramadan ou em outra época do ano, não ouvi nenhuma irmã recitando.

Como homem, aprecio a beleza da voz feminina. Como religioso, sempre apreciei as recitações do Alcorão. Ora, não entendo o porque de certas proibições quanto à recitação pública por mulheres. Citarão hadices, citarão parecer de escolásticos, citarão X textos que embasam tal proibição. Allah nos liberte dessas proibições. O Alcorão veio para libertar a humanidade de todas as proibições impostas pelos homens para que tenhamos somente A Vontade de Allah sobre a Terra. Insh'Allah viveremos em um mundo no qual todos possam recitar o Alcorão, sem sexismo ou restrição de gênero.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Taqwacore - Islã Punk


Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

O livro de Michael Muhammad Knight, The Taqwacores, nos apresenta o Islã Punk. Ora, o que mais esperar de uma sociedade na qual a procura por valores é desesperada, na qual todas as pessoas procuram alguma orientação para a vida? De algum modo, não seria de se estranhar que diversas orientações encontrassem diversos pontos de convergência. A procura dessa convergência se tornou um livro; tal livro virou um documentário, Taqwacore - The Birht of Punk Islam (ou Taqwacore - o nascimento do Islã Punk), disponível na íntegra aqui. Os gritos de Allahu Akbar, ao som de guitarra e bateria, me parecem um tanto quanto fora de lugar. Provável que a ignorância seja minha.

O Islã Punk, se é possível referir-se a tal fenômeno cultural, é uma manifestação dessa procura. O anarquismo e o Islã também possuem uma confluência; entretanto, a estética do Islã Punk ainda deve muito ao Islã. Deve no sentido de dívida mesmo: é possível conciliar um modo de vida punk com um modo de vida islâmico? Certamente a ideia de associar tais elementos possui um fundo sensacionalista e é midiaticamente apelativo. Sinceramente, eu que me esforço por não julgar - uma vez que é de Allah todo julgamento - ainda não tenho palavras para descrever o que sinto. O que mais se aproxima é um misto de cautela e esperança.

... a única coisa que posso lhes recomendar, irmãos na fé e na humanidade, é que se tiver dúvidas quanto a algo, saiba que Allah sabe melhor. Se me perguntar sobre o Taqwacore, só poderei dizer: Allah sabe melhor, de Allah é toda benção e julgamento. Que Ele abençoe nossos irmãos punks. Se eles se declaram muçulmanos, então são muçulmanos. Como digo: é impossível não ser muçulmano.

Maiores informações sobre esse fenômeno cultural caracteristicamente pós-moderno, acesse: http://www.taqwacore.com/. Assumo meu preconceito com um fenômeno que mal conheço, com uma vida que não vivo, com um modo de ser que não compartilho. E que Allah me perdoe e me guie para encontrar a beleza possível nessa manifestação humana.

[Sharia law in the USA parece uma ideia tão boa quanto Anarchy in the UK... não posso negar que sorri ao ver o título da música]

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Um pouco de heterodoxia


Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

Irmãos de fé e na humanidade, a partir de amanhã e pelos próximos três dias, pretendo abordar alguns aspectos do islamismo do qual tenho alguma suspeita. Sim, seria hipócrita não assumir que fico estarrecido com alguns aspectos do Islã praticado pelos meus irmãos.

Assim, seguirão as seguintes postagens:
- Taqwacore, sobre o encontro do islamismo com o punk. Nunca tive tantas dúvidas em reconhecer alguém como muçulmano - nem assistindo alguns rituais de auto-flagelação...
- Uma mulher recitando a Surata al-Fajr, algo que pode ser entendido como inadequado. A misoginia árabe se inseriu no islamismo a ponto de impedir a divulgação dessa ocasião. Até os dias de hoje.
- O Hajj em sua materialidade, como é feito no seu sentido mais cru do termo. Mesmo sendo um dos pilares inabaláveis do Islã, o islamismo tem se esforçado em deturpar seu caráter original.

Que Allah me perdoe ou me puna se cometo alguma injustiça ou se uso esse espaço de modo indevido, mas creio que é necessário saberem que minha postura crítica também se aplica ao islamismo. Ao islamismo. O Islã é perfeito; sua variante meramente humana, o islamismo, essa não podemos honrar integralmente.

Cidades



Nosso mundo está doente, garoto. Um vírus apareceu a muito tempo atrás e estamos tão acostumados a seus efeitos que esquecemos como era viver antes de estarmos doentes.

Estou falando das cidades, percebe?

As culturas humanas são originalmente homeoestáticas: elas existiam em um equilíbio auto-sustentável, sem a noção de tempo e progresso, como nós temos.

Então o vírus-cidade apareceu. Ninguém sabe ao certo de onde veio ou quem o trouxe, mas como todos os organismos virais, sua diretriz primária é usar todos os recursos disponíveis para produzir cópias de si mesmo.

Mais e mais cópias até que não existe matéria-prima, deixando para trás um hospedeiro sobrecarregado que pode, apenas, morrer.

As cidades desejam que sejamos bons construtores. Eventualmente, construímos foguetes para que o vírus atinja outros mundos.

As cidades possuem seu modo particular de falar com você; tome o vislumbre do reflexo de um signo em neon e ele pronunciará uma palavra mágica para conjurar sonhos estranhos.

Você nunca viu a palavra "IXAT" brilhando na noite? Esse é apenas um de seus nomes sagrados.

[extraído de The Invisibles - no.3, nov. 94, p. 10 - tradução de Muhammad F.]

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Brinquedos



Sua cabeça é como a minha, como todas as outras cabeças: grande o bastante para conter toda divindade ou demônio que já existiu, Grande demais para conter todo o peso dos oceanos ou das estrelas. Todo o universo cabe nela.

Mas o que escolhemos manter nesse contêiner maravilhoso? Pequenas coisas quebradas, tristes brinquedos que acostumamo-nos a usar de novo e de novo.

[extraído de The Invisibles - no.3, nov. 94, p. 20 - tradução de Muhammad F.]

Sobre o caráter sexual do Paraíso (Parte II)


O Paraíso é um signo: um espaço circular onde se dão condições especiais. Prazer, abundância, eternidade, potência, serenidade e conexão. Imediaticidade do objeto do desejo, ausência de dor. Todos temos ao alcance das mãos húris e frutas desejadas. Eternidade do gozo e do relacionamento. O gozo é eterno quando promove a união, quando lhe é subtraída toda condição temporal, quando não é limitado, mas pleno, direto ao centro no qual a serenidade repousa. Proximidade do prazer e do divino. Prazer sereno e abundante, potência recursiva capaz de fazer-se eterna...

Fazer amor é um feitiço, ainda mais se esse feitiço de produz em um círculo de feitiços. O temporal se imanta de seu fragmento eterno, somos apenas corpo. Corpo espiritual e desejoso, com a ruptura dos estereótipos: o espiritual é carnal, encarnado-se em uma imago que transpõe os mundos e destrói as distâncias. Nas narrativas sobre o Paraíso nos fazemos capazes de incendiar e aflorar a potência, capazes de regar o ventre das húris.

O ato sexual interrompe o fluído temporal como um fogareiro luminoso, sendo a morte do Eu que nos limita. É um imã do paraíso: não viemos do passado, fluímos por toda a eternidade. O futuro não é temido, mas desejado: aquilo que é próprio de todo desenvolvimento. O ato sexual é um rito: convocatória de um futuro que se situa à margem do fluído temporal como culminação de todos os processos. É o eros da proximidade, o horizonte clamado. Penetrar o sexo da húri é habitar a aurora, esse espaço entre o céu e a terra em cada amanhecer.

Eros pertence ao cosmos primogênito: é anterior a nós mesmos. É a energia criadora, essencialmente benigna, carregada de baraka [bençãos]. Os eventos eróticos que ocorrem no Paraíso são a celebração dessa energia. A energia sexual é fluída: nada a controla. A descrição corânica do Paraíso tem a capacidade de despertar essa energia. A recitação desses versículos provoca uma catarse, por isso se dizem em voz baixa. A recitação possui força: fazemos descer por nossas gargantas aqueles signos pelos quais a Criação se realiza. Nosso presente se desestabiliza, perde seus contornos. Perante a imagem fluída da húri se assustam os clérigos e orientalistas [bem como os islamófobos...]. Estes tratam de explicá-la, de racionalizá-la e buscar um sentido alegórico em todos esses signos. Mas não nos confundamos: o Paraíso de Allah se apresenta de um modo abertamente erótico.

Não se trata de se faremos ou não amor no Céu, entre as nuvens, nem de crer ou não na literalidade dessas descrições. Se trata de que alguns signos escolhidos por Allah para representar a felicidade suprema nos remetem [também] à sexualidade humana. Isso é algo que numerosos comentaristas da tradição profética tem notado, com maior ou menos consciência de suas conotações, com maior ou menor complacência. Tudo isso não significa que nós, muçulmanos, sejamos obsessivos sexualmente, mas bem remetem à alta estima na qual Allah situa o prazer sexual e o cumprimento do desejo. Quem não se dá conta disso permanecerá cego, alijado do Paraíso.

[extraído de Seyyed az-Zahirí, Sobre el carácter sexual del Paraíso, In.: Palabras para resucitar al-Andalus: textos essenciales del pensamiento islámico actual, p.79, disponível em http://www.vicentehaya.com/resources/TEXTOS-ESENCIALES-DEL-PENSAMENTO-ISLAMICO-ANDALUSI.pdf - tradução de Muhammad F.]

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Sobre o caráter sexual do Paraíso (Parte I)



Que é o prazer? Não havendo uma definição generalizada, busquemos aquilo que se sabe. Sentimos prazer na união sexual ou ao comer um fruto, ao sentir uma melodia harmoniosa, ao saborear uma paisagem ou as carícias do sol sobre o rosto, ou - nesses momentos de bem-estar indizível - quando há um "brilho instantâneo". Seja qual for seu grau ou origem, o prazer é algo passageiro, que se situa como uma exceção no tempo e é precedido ou seguido por enormes espaços de tempo.

Já foi repetido à exaustão: todo prazer é efêmero. Banalidade que não não é capaz de dizer o importante: seu caráter efêmero é o que lhe outorga sentido. Buscar prazer é buscar algo efêmero, que desaparece em um instante. Mas por acaso não existem instantes de fulgor que duram mais que várias horas de tédio? Por acaso não mostra o prazer que todo tempo é relativo? Pensemos no orgasmo: horas de sedução e esforço para conquistar algo que se consome em si mesmo, deixando-nos exaustos. Nada disso teria sentido se o caráter se o caráter efêmero do prazer não escondesse seu segredo, a saber: a realização de uma promessa. A promessa é a união que não se recorda do momento anterior à cisão. O prazer sexual é a fusão: "borra" as distâncias. Essa fusão não é confusão, logrando ao indizível: sentimo-nos, ao mesmo tempo, fundidos ao outro sem deixar de sermos nós mesmos, conservando nossa individualidade. Esse é um ponto: o orgasmo é um metáfora do êxtase místico, do estado, apenas perceptível, de fusão com a divindade. Dura um segundo e depois desaparece, nos devolvendo ao tempo da separação e da distância.

Se o prazer é efêmero e é precedido por um tempo e seguido por outro tempo, o infinito não é algo que se suceda, tendo anterioridade ou posteridade por nada. É o tempo sem instante, o tempo como um todo, que flui ininterrupto. A vida da criatura, ao lado do infinito de Allah, é quase tão efêmera como o prazer. À diferença do prazer, a vida da criatura está envolta por um infinito do qual não existe distância. Assim, o prazer é percebido como um efêmero dentro de outro efêmero que não se percebe como tal.

Infinito e prazer, humanidade e eternidade, são águas que se esvaem por causas diferentes. Ainda assim, é algo que se busca e se encontra como possibilidade na consciência. À união entre prazer e infinito de dá o nome de Paraíso. O lugar onde o prazer se faz ao infinito e onde o infinito encontra a vida: se faz saboroso, se humaniza. A eternidade humana é um mistério: de como não somos senão somente criaturas no tempo de nossa experiência limitada, sem que sejamos eternos com Allah. Isso quer dizer que já existíamos antes de nossa existência concreta, que estávamos inscritos em Allah como uma possibilidade de vida. Quer dizer que o tempo vital que nos foi designado não revoga nossa eternidade em Allah.

[extraído de Seyyed az-Zahirí, Sobre el carácter sexual del Paraíso, In.: Palabras para resucitar al-Andalus: textos essenciales del pensamiento islámico actual, p.78, disponível em http://www.vicentehaya.com/resources/TEXTOS-ESENCIALES-DEL-PENSAMENTO-ISLAMICO-ANDALUSI.pdf - tradução de Muhammad F.]

sábado, 8 de fevereiro de 2014

Resposta do Victor


Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

A resposta de meu amigo à postagem que lhe dediquei está nesse link: http://cegoemtiroteio.com/2014/02/08/ateismo-teismo-e-estupidez/

Com muita satisfação, e contrariando uma série de dogmas disseminados, que divulgo sua resposta. Comentando sua postagem, disse que damos as mãos para lutarmos conta a ignorância, que um ateu e um muçulmano podem fazê-lo.

Boa leitura do texto de meu irmão e que a paz, as bençãos e a misericórdia de Allah estejam conosco do começo dos tempos ao dia do Juízo.

Muhammad (sas) e a Educação


Tradução dedicada para meu amigo Victor Caparica, exemplo na minha procura do conhecimento,  meu parceiro nessa senda. Te amo. Recomendo seu blog, www.cegoemtiroteio.com.

A tribo de Quraish, especialmente um de seus ramos, o clã de Sa'd, dentre os quais Muhammad passou sua infância próximo ao Monte Taif, situado a leste de Meca, eram reconhecidos na Arábia pela pureza e eloquência de sua linguagem. Willian Muir escreveu em "A vida de Muhammad" [The life of Muhammad] (Londres, 1923, p.7) que "Sua fala foi formada sobre um dos mais puros modelos da bela língua dessa península." Tal meio não haveria de falhar em fazê-lo um homem de algum refinamento e gosto; sem dúvida foi isso que o permitiu atrair homens muito mais instruídos que ele. Muhammad pregou um inestimável valor ao conhecimento, trazendo seus seguidores das trevas da ignorância para a luz.

Conta-se que um homem aproximou-se de Muhammad e perguntou-lhe "O que é ilm?" Ele respondeu clareza / justiça (insaf). O homem perguntou novamente "E o que mais?" O Profeta respondeu escuta (istima). Então o homem perguntou "E o que mais?" O Profeta disse concentração (hifz). O homem perguntou de novo "E o que mais?" E ele respondeu ação (amal) em acordo com o conhecimento. Por fim, o homem questionou "E o que mais?" Muhammad respondeu dissemine-o (nashruhu).

O interesse de Muhammad pela educação também pode ser julgado pela tradição citada por Ibn Sa'd, em "Tabaqat", de que entre os prisioneiros mecanos da batalha de Badr haviam muitos que não podiam pagar por sua liberdade; então os letrados dentre eles foram ordenados para que ensinassem para ao menos dez crianças muçulmanas aquilo que sabiam como forma de pagamento. Zaid bin Thabith, que mais tarde tornou-se famoso como um dos escribas das revelações corânicas, aprendeu a ler e escrever dessa forma. É interessante mencionarmos ainda que Muhammad encorajou o aprendizado de línguas estrangeiras, sendo Zaid bin Thabith lembrado por ter aprendido persa, grego, etíope, aramaico e hebraico. De acordo com H. E. Barnes em "Uma história das escritas históricas" [An history  of historical writings] (Oklahoma, 1937, p.93), "Em muitos sentidos, a mais avançada das civilizações na Idade Média não foi a cultura cristã, mas antes o povo que tinha o Islã como fé."

O Alcorão Sagrado não é infértil sobre o assunto. Somente no Alcorão temos 704 versos nos quais tanto a palavra ilm quanto suas variações são usadas na seguinte ordem: a'lam: 49 vezes; al-ilm: 80 vezes; a'lamu: 11 vezes; alim: 162 vezes; a'lim: 13 vezes; ilman: 14 vezes; i'lamu: 27 vezes; ma'lum e ma'lumat: 13 vezes; ya'lamu: 93 vezes; ta'lmun: 56 vezes. Canetas e livros são auxílios essenciais ao processo de conhecimento; para eles, temos a ocorrência de qalam 2 vezes e al-kitab 230 vezes. Além disso, algumas palavras relativas à escrita, como kataba, katabna, kutiba, katib, yaktubu, naktubu, são usadas em numerosos versos. O total numérico de versos corânicos utilizando palavras relativas à escrita são 319, sendo a palavra kitab utilizada em 81 ocasiões diferentes. Isso é o suficiente para mostrar em que extensão o conhecimento e seus meios de aquisição são enfatizados no Alcorão, existindo excelente elaborações ainda nos ditos de Muhammad.

Consequentemente, devemos lembrar que a avançada civilização da Idade Média originada pelos muçulmanos só foi possível pelo advento dos ensinamentos corânicos e pela recordação dos ditos de Muhammad relativos à educação. Abaixo, apresentaremos alguns fragmentos dos ensinamentos de Muhammad:


  • Do berço ao túmulo, procure conhecimento.
  • A tinta do acadêmico é mais sagrada que o sangue do mártir.
  • A aquisição de conhecimento é um dever do qual todo muçulmano está incumbido, homem ou mulher.
  • Não há de morrer aquele que está aprendendo.
  • O pior dos homens é o mal educado, sendo o melhor deles o mais educado.
  • Ouvir as palavras do estudiosos e assistir às lições da ciência é melhor que os exercícios religiosos.
  • Adquira conhecimento: isso permite a seu possuidor distinguir o certo do errado; guiando-o à felicidade; sustentando-nos na miséria; sendo um ornamento entre os amigos e uma armadura contra os inimigos.
  • Vá até a China em busca de conhecimento.
  • Conhecimento excessivo é melhor do que oração excessiva.
  • Aquele que honra os estudiosos, honra a mim.
  • Um homem esclarecido é mais pesado para o demônio do que mil fiéis ignorantes.
  • A superioridade do homem esclarecido sobre o fiel ignorante é tal qual o da lua cheia sobre as estrelas.
  • Pessoas são como minas de ouro e prata. A mais excelente dentre elas no Islã são aquelas que adquirem conhecimento.
  • Conhecimento é mantido somente pelo ensino.
  • Os estudiosos são os herdeiros dos profetas. Eles possuem o conhecimento como sua herança; aquele que possui essa herança possui uma imensa fortuna.
  • A cura para a ignorância é a pergunta.
  • Um estudioso tem mais poder que mil homens devotos sobre o diabo.

[extraído de http://www.ismaili.net/histoire/history03/history335.html - tradução de Muhammad F.]

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O caráter sexual do Paraíso Islâmico



Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

A partir de amanhã e na próxima semana, iniciaremos a tradução de um texto sobre o aspecto sexual do paraíso islâmico. Conhecemos algumas críticas que se atém a não ouvir os místicos, que se atém somente a criticar uma religião com base em seus fragmentos...

Ora, tal característica é um problema. Não que em nosso blog não tenhamos cometido esse tipo de injustiça: para isso, pedimos o perdão de Allah. Mas não podemos agir de outra forma, ignorando tal questão. Não é possível ignorar que as pessoas sentem desejos e que o Paraíso é uma manifestação do cumprimento desses desejos.

No Islã, temos a narrativa alegórica de que seremos ressuscitados com os mesmos e, ao mesmo tempo, novos corpos. Tais corpos serão materiais mas não serão materiais. Serão corpos completos. E a completude do corpo envolve, sim, sua sexualidade.

Pedimos a compreensão de nossos leitores, sabendo que é um assunto extremamente delicado. Sabemos o quanto orientalistas, islamófobos e demais reducionistas se apressam a criticar o Islã por defender que o Paraíso envolve o prazer sexual. Entretanto, dizemos, para essas pessoas, que devem experimentar o rompimento de fluxo com a existência que o orgasmo proporciona e que percebam a obviedade de que a existência humana demanda a completude.

Deus nos ajude nesse empreendimento; Deus esclareça-nos no sentido de nos compreendermos e aprendermos uns com os outros.

Ibn Sina e a Psicologia Islâmica


Ibn Sina (981-1037 da Era Comum) foi a maior influência sobra a história da psicologia islâmica, tomando as ideias gregas e adaptando-as para se encaixarem na doutrina islâmica. Ele iniciou com a ideia aristotélica de que os humanos possuem três tipos de alma, sendo a vegetativa, a animal e a psique racional. As duas primeiras atrelam o Homem á terra enquanto a psique racional conecta-o a Deus.

No mesmo sentido, a psicologia islâmica de Ibn Sina propunha que os cinco sentidos, compartilhados com os animais, eram vínculos terrenos. Ele acreditava que a habilidade para raciocinar concedia à humanidade uma conexão única com o divino. Ibn Sina procurou atribuir certas habilidades mentais a partes específicas do cérebro, porém a proibição islâmica de dissecar [carece de fontes] previniu-o de reunir evidências observáveis para embasar suas teorias.

Ibn Sina também propôs que os humanos possuíam sete sentidos internos que complementavam os outros sentidos. Na longa história da psicologia, essa foi uma das primeiras tentativas de compreensão da forma que mente e razão operam.


A psicologia islâmica de Ibn Sina

  • Senso comum: esse sentido congrega as informações reunidas pelos sentidos externos.
  • Imaginação retentiva: esse sentido recorda a informação reunida pelo senso comum.
  • Imaginação animal composta: esse sentido a todos os animais aprenderem o que evitar e o que procurar, de forma ativa, em seu meio natural.
  • Imaginação humana composta: esse sentido auxilia os humanos a aprenderem o que evitar ou procurar no mundo que os rodeia.
  • Poderes de estimativa: essa é a habilidade de realizar julgamentos inatos sobre o ambiente circuncidante e a determinar aquilo que é benéfico ou perigoso. Por exemplo, um medo instintual e inato de predadores cairia sobre esse sentido.
  • Memória: a memória é responsável por recordar todas as informações desenvolvidas pelos outros sentidos.
  • Processamento: essa é a habilidade para usar todas as informações e é o mais elevado dos sete sentidos internos.


[extraído de http://explorable.com/islamic-psychology - tradução de Muhammad F.]

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

O verdadeiro inimigo



Nossos inimigos não são Judeus ou Cristãos; nosso inimigo é nossa própria ignorância. - Imam Ali Ibn Abi Taleb (AS)

[extraído de http://thebeautyofislam.tumblr.com/post/23464503720 - tradução de Muhammad F.]

Umm Waraqah



Umm Waraqah foi contemporânea do Profeta Muhammad. Ela sabia todo o Alcorão. Por causa disso, Muhammad apontou-a para liderar um grupo de homens e mulheres na oração. O exemplo de Umm Waraqah é baseado em um hadith tido como forte, transmitido por ibn Sa'd al-Baghdadi [bn Sa'd: Kitab al-Tabaqat al-Kabir, vol. 8, p. 335.].

Por causa da força dessa evidência, o exemplo de Umm Waraqah serve como embasamento para a opinião, entre alguns juristas islâmicos, de que às mulheres é permitido liderar não somente outras mulheres na oração, mas mesmo liderar congregações mistas [ou seja, com homens e mulheres]. Essa é uma opinião minoritária na tradição Hanbali.

Devido ao fato de que Umm Waraqah ter sido uma das poucas pessoas a memorizarem o Alcorão por completo, ela foi uma de suas poucas transmissoras antes que o livro fosse compilado em formato escrito.

[extraído de http://en.wikipedia.org/wiki/Umm_Waraqa - tradução de Muhammad F.]

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Não fique irado e entrará no Paraíso


Abu ad-Darda relatou: Eu disse "Oh, Mensageiro de Allah, diga-me sobre um feito que me dará entrada no Paraído." O Mensageiro de Allah, que a paz e as bençãos estejam sobre ele, disse "Não se enfureça e você entrará no Paraíso."

[extraído de http://www.eislamicquotes.com/hadith-on-anger-paradise-1/ - tradução de Muhammad F.]

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Sonho e vigília



Na verdade, quando se trata de falar sobre o real, não há diferença entre o sono e a vigília, mas convém que não distorçamos os fatos que identificam que nossas experiências oníricas são falsas ou que apenas as experiências de vida que são experiências de vigília sejam reais. Parece que, atualmente, decidiu-se negar o valor do sonho nas sociedades tradicionais (só porque os nossos sonhos não são mais significativos do que o nosso desconforto psíquico).

[extraído de El secreto de Muhammad: la experíencia chamánica del Profeta del Islam, de Abdelmumin Aya, p.66 - tradução de Muhammad F.]

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Deixando o mundo para trás


Buda fundou seu Caminho no fato humano do sofrimento. O Islã retorna à situação básica na qual nos encontramos uma interpretação levemente diferente: o homem, em seu estado ordinário de consciência, está literalmente adormecido ("e quando morrerem, despertarão", como Muhammad disse). Ele vive em um sonho, seja de prazer ou de sofrimento - algo fenomenal, de existência ilusória. Apenas o baixo si-mesmo está desperto, sua "alma carnal". Sentindo-se bem ou não, ele é um miserável. Entretanto, potencialmente essa situação poderá ser modificada, pois o homem fundamental / primordial [ultimately man] não é idêntico com o baixo si-mesmo. (O Príncipe de Balkh, Ibrahim Adham, perdido no deserto enquanto caçava, perseguiu um veado encantado que virou-se para ele e perguntou "Onde você nasceu para isso?") A experiência autêntica humana está no divino; ele tem um si-mesmo elevado, o qual é verdadeiro; ele pode atingir a felicidade, mesmo antes da morte ("morra antes de morrer", disse o Profeta). O chamado é feito: para voar, migrar, uma jornada para além dos limites do mundo e do si-mesmo.

[tradução de trechos de Introduction to Sufi Path, de Peter Lamborn Wilson, a.k.a. Hakim Bey, extraído de http://hermetic.com/bey/intro-sufi.html - tradução de Muhammad F.]

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Crash - no limite

Para M.C.

O que dizer de um filme como Crash - no limite? Não é um filme que você gosta. Não é um filme que alguém deva gostar. Pelo contrário, deve detestar as situações de preconceito e de discriminação, as misérias humanas que são mostradas e seus protagonistas. Não sou crítico de cinema, mas realizarei algumas indicações...

As atuações são excelentes. Todos os personagens conseguem transmitir a vertigem de sua condição humana, recheadas de contradições e semelhanças com exemplos cotidianos, exemplos que encontramos em nós mesmos também. Me lembro, por exemplo, da primeira vez que entrei em uma mesquita xiita e de todo preconceito que eu tinha. Lembrei da primeira vez que fui a uma festa onde maioria das pessoas eram negras e do "natural" sentimento de deslocamento que tive. Lembro de muitas misérias minhas que trabalhei e que pude superar somente com as esmolas e contribuições morais que recebi, para o bem e para o mal, de meus irmãos na humanidade.

A direção é excelente. Todas as cenas são muito bem focalizadas, os jogos de luz e sombras; as cenas diurnas me pareceram ter uma finalidade de esclarecimento, enquanto as noturnas puderam indicar os sentimentos íntimos / internos dos personagens.

Se estou elogiando os elementos do filme, por que não gostar dele? Por que ele não é uma filme para apreciar. É um filme para aprender, para aprender uma dura lição: a de que somos, no limite, miseráveis, que nos esbarramos e nos machucamos em nosso cotidiano e em nossas vidas, que podemos realmente destruir a vida de uma pessoa com um simples gesto ou ação, ou mesmo retirar a esperança de um coração por não termos a (sagrada) compreensão de nosso papel na vida de nossos irmãos. Quando perdemos a perspectiva humana - ou seja, universal -, corremos o risco de repetir os erros dos protagonistas desse filme.

... gostar de Crash - no limite é como gostar de "Um homem é um homem" de Bertolt Brecht, é como gostar da miséria humana. Certamente, nenhuma miséria humana é digna de apreço; as lições que elas trazem sim. Desse modo, sou extremamente feliz por ter tido a oportunidade de aprender muito vendo esse filme. Como obra de arte? Excelente filme. Como lição? Excelente também. Como representação da escuridão de nossa alma? Medonhamente exato.

Durante o filme, chorei; principalmente após a primeira meia hora, quando percebi o quanto estive um dia embrenhado no preconceito e nas trevas da ignorância. Não que não esteja mais, o que me deixou triste, mas o quanto ainda tenho que combater por mim e pelos outros. Essa jihad é essencial... Já disse o Profeta Muhammad, que a paz e as bençãos de Allah estejam sobre ele, no Sermão da Despedida que Um árabe não é superior a um não-árabe, nem um não-árabe tem qualquer superioridade sobre um árabe; o branco não tem superioridade sobre o negro, nem o negro é superior ao branco; ninguém é superior, exceto pela piedade e boas ações.  Aprendam que todo muçulmano é irmão de todo muçulmano e que os muçulmanos constituem uma irmandade. Nada que pertença a um muçulmano é legítimo para outro muçulmano a menos que seja dado de livre e espontânea vontade. Portanto, não cometam injustiças contra vocês mesmos. (extraído de http://www.islamismo.org/ultimo_sermao.htm)


Como costumamos dizer muitas vezes ao dia: Allah, guia-nos à senda reta. Tal filme perpassa pelas lições dessa senda.

Ainda vivemos na Era Neolítica


Estamos basicamente vivendo no período agrícola-industrial e ainda praticamos o sacrifício. Se não acredita nisso, venha para o estado de Nova Iorque, onde acabaram de reinstituir a pena de morte - um sacrifício simbólico. Em algum momento, a beligerância primitiva transformou-se na beligerância clássica e aqui está algo interessante sobre a rede [net]. A rede nasceu muito mais como uma estrutura de beligerância primitiva do que uma estrutura clássica, por conta dessa estranha necessidade gnóstica para evitar a desintegração atômica. A rede tornou-se em um espaço no qual o poder é disperso ao invés de centralizado. Pensam que essa é uma estratégia brilhante. Descobriu-se que, assim, perdeu-se o controle da rede quase instantaneamente. Eles deveriam perceber que que um sistema não-centralizado não poderia ser mantido sob controle de fora desse sistema. Se você toma um sistema fechado e o descentraliza, então não haverá modo de recentraliza-lo. Essa recentralização do poder provirá de fora desse sistema.

(...) Todas as pessoas que conheci nos anos 60 e 70 que eram aficcionados por telefone migraram para a rede. O telefone é tão fora de moda, como água corrente quente e fria. Ninguém mais pensa sobre o telefone, não há sentido [mumbo jumbo] no telefone. Não há mais magia no telefone. A magia está toda na rede, de modo que todos anseiam por controlá-la.

[tradução de trechos do texto Islam and the internet: net-religion, a war in heaven, de Peter Lamborn Wilson, a.k.a. Hakim Bey, extraído de http://hermetic.com/bey/pw-islam.html - tradução de Muhammad F.]

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Antes que julgue os outros...


Antes que julgue os outros ou clame conhecimento de alguma verdade absoluta, considere que você enxerga menos de 1% do espectro eletromagnético e ouve menos de 1% do espectro acústico. Enquanto lê isso, você está viajando a 220 km por segundo através da galáxia. 90% das células do seu corpo possuem seu próprio DNA microbial e não são "você". Os átomos no seu corpo são 99,9999999999999999% de espaço vazio e nenhum deles são os mesmo desde seu nascimento, sendo originados no interior de estrelas. Seres humanos possuem 46 cromossomos, 2 a menos que uma batata. A existência do arco-íris depende dos fotorreceptores cônicos de seus olhos; para animais sem cones, o arco-íris não existe. Assim, você não enxerga um arco-íris, você o cria. Isso é assustador, especialmente se considerarmos que todas as belas cores que vê representam menos de 1% do espectro eletromagnético.
(tradução de http://9gag.com/gag/azbGAEN - por Muhammad F.)