segunda-feira, 26 de maio de 2014

O que é simbolismo? - por Martin Lings (pt. 2)


O próprio Espírito encontra-se aberto à Suprema Fonte de toda luz, tornando-se, para aquele cujo Coração está desperto, uma continuidade entre as Qualidades Divinas e a alma, um raio que passa por Elas do Espírito ao Coração, a partir do qual difunde-se em múltiplas refrações ao longo dos diversos canais da substância psíquica. As virtudes que são deste modo gravadas na alma não são outra coisa senão projeções das Qualidades e, inversamente, cada uma das imagens projetadas estão abençoadas com a intuição de seu Arquétipo Divino. Assim como para a mente, com sua razão, imaginação e memória, uma medida da "luz lunar" que é recebida pelo Coração é passada aos sentidos e os atingem tanto quanto os objetos externos que podem ver e ouvir e sentir; neste contato mais distante, o raio é então invertido, pois as coisas do macrocosmo são reconhecidas como símbolos, isto é, como manifestações semelhantes ao Tesouro Escondido, cada uma delas possuindo sua contraparte no microcosmo. Expresso de outro modo, tudo para o homem primordial, interna ou externamente, era transparente: ao encontrar um símbolo, ele experimentava seu Arquétipo. Ele era, portanto, capaz de se alegrar ao perceber-se exteriormente cercado e interiormente adornado pelas Presenças Divinas.

A ingestão do fruto da árvore proibida foi a conexão com um símbolo tão somente para o bem do próprio Homem, para além de seu significado mais elevado. A violação da norma interrompeu o acesso do Homem ao seu centro interior: a consequente indefinição de sua visão o fez incapaz de cumprir adequadamente sua função original, a de mediador entre o Céu e a Terra. Apesar de sua queda para o microcosmo, o macrocosmo permaneceu elevado; ainda que seus símbolos tenham se tornado menos aparentes para a percepção humana, eles permaneceram em sua perfeição original. Apenas o homem primordial faria justiça a esta perfeição: ao mesmo tempo, ele permaneceria independente dos símbolos, em virtude de ser ele mesmo um símbolo da Essência Divina, que é absolutamente Independente das Qualidades Divinas. O homem decaído, por outro lado, teve uma lição a aprender do grande mundo que o circulava, pois seus símbolos ofereciam uma iluminação que guiariam-no para o caminho de retorno que havia perdido enquanto sua perfeição poderia evidenciar a perfeição de suas contrapartes internas que sofreram com a Queda. As nuvens do macrocosmo não são permanentes; elas surgem apenas para partir, pois as luzenças ainda brilham e as direções do espaço nada perderam de sua imensurabilidade. Entretanto, no homem decaído a alma não é mais uma ampla imagem do Infinito, como foi criada para ser, e o firmamento interno está velado. Este velamento é um resultado crítico da Queda, a qual não interrompeu a conexão entre a alma e o Espírito, entre a percepção humana e os Arquétipos, mas estabeleceu uma barreira que é mais ou menos opaca - cada vez mais opaca com o distanciamento humano do fato original, o que acelera a degeneração gradual que inevitavelmente ocorre com o passar de cada ciclo temporal. No contexto de nosso tema, a barreira pode ser descrita como mais ou menos transparente, uma vez que não teria sentido falar em simbolismo onde não poderia haver ao menos alguma intuição, mesmo que enfraquecida, dos Arquétipos. Ademais, a ciência dos símbolos é inextrincavelmente vinculada com o caminho de retorno, o qual, seguindo no caminho contrário à esta corrente cíclica, realiza um aumento daquela transparência.

(extraído de http://www.reneguenon.net/oinstitutotextosLingsSymbol.html - tradução Muhammad F.)

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